Resposta à acusação, defesa prévia e defesa preliminar
Na
prática, muitos profissionais utilizam as expressões como se fossem
sinônimas. Não há erro algum nisso, tampouco há prejuízo à defesa, desde
que as teses e os pedidos estejam corretos. Além das três nomenclaturas
trazidas no título deste tópico, há uma porção de outras, tais como
“resposta preliminar”, “resposta do réu” etc. Contudo, para que o leitor
não confunda as peças, o manual adotará o posicionamento a seguir.
Recebimento e oferecimento
O
recebimento não pode ser confundido com o oferecimento, que é o ato de
ajuizamento da ação, seja por denúncia ou queixa. No recebimento, que é
posterior ao oferecimento, a petição inicial é encaminhada ao juiz
competente, que, com base no art. 395 do CPP, pode ou não recebê-la.
Portanto, o recebimento não é o simples ato de entrega física da petição
ao juiz, mas a decisão a respeito de sua admissibilidade ou não.
A
compreensão dessa distinção é fundamental para que se identique o
momento de cabimento de cada uma das peças que serão estudadas neste
tópico, existindo influência direta entre ele, a tese e o pedido.
Defesa prévia (art. 55 da Lei 11.343/06)
Segundo
o art. 55 da Lei 11.343/06 – a “Lei de Drogas” -, oferecida a denúncia,
o juiz ordenará a notificação do acusado para apresentar defesa prévia,
por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. Portanto, com base na redação
do dispositivo, é possível identificar com facilidade o momento: logo
após o oferecimento, mas antes do recebimento.
Essa
informação tem influência direta na tese e no pedido da defesa prévia.
Como a inicial ainda não foi recebida, o objetivo principal é demonstrar
ao juiz a presença das hipóteses do art. 395 do CPP, para que não a
receba.
A
defesa prévia do art. 55 é exclusiva para os crimes previstos na Lei
11.343/06. Não existe, no procedimento comum, qualquer peça equivalente.
Ademais, por força do art. 55, § 3º, percebe-se que a peça é
imprescindível, sob pena de nulidade do processo.
Defesa preliminar de funcionário público (art. 514 do CPP)
O
artigo 514 do CPP fala em “responder por escrito”. Portanto, caso o
profissional opte por intitular a peça como “resposta escrita”, não será
o caso de atecnia. No entanto, no manual, o termo será o mesmo adotado
por boa parte da doutrina.
Assim
como ocorre na defesa prévia, da “Lei de Drogas”, a defesa preliminar
do art. 514 é anterior ao recebimento da denúncia, mas posterior ao seu
oferecimento. Com base nisso, presume-se o objetivo principal da peça:
convencer o juiz a não receber a denúncia.
Sobre
a sua ausência gerar nulidade absoluta ou relativa, há divergência na
jurisprudência. Para o STF, no entanto, trata-se de nulidade relativa
(informativo n. 572). A peça é cabível quando o crime for afiançável e
praticado por funcionário público no exercício da sua função.
Por
fim, vale menção o Enunciado n. 330 da Súmula do STJ: “É desnecessária a
resposta preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo
Penal, na ação penal instruída por inquérito policial”.
Resposta à acusação (art. 396 do CPP)
Exigida
com muita frequência no Exame de Ordem, a resposta é uma peça que
comporta uma infinidade de teses e pedidos. Para que a abordagem seja a
mais completa possível, veremos os temas, a seguir, individualmente.
396 ou 396-A?
Sempre
há desentendimento quando o assunto é a fundamentação da resposta à
acusação. Para mim, não há a menor dúvida de que é o artigo 396, pois o
396-A apenas traz o que pode ser alegado na peça. Para outros, todavia, a
peça deve ser embasada no art. 396-A, e não no 396. Em Exame de Ordem,
para não ter erro, é melhor citar os dois, ainda que isso custe alguns
décimos. A correção da FGV tem sido tão grosseira que, caso a
instituição adote apenas um dos artigos, não duvido que o examinador
venha a aplicar zero para quem escolher o outro. Obviamente, caso isso
ocorresse, a situação seria revertida após os recursos. Contudo,
questiono: vale o estresse? Na dúvida, mencione os dois. Por fim, se o
processo seguir o rito especial do júri, a resposta à acusação deverá
ser fundamentada com base no art. 406 do CPP.
Obrigatoriedade
A
ausência de resposta à acusação gera a nulidade do processo. Prova
disso é o artigo 396-A, § 2º, que prevê a nomeação de defensor para a
apresentação de resposta à acusação, caso o réu não o faça ou não
constitua advogado no prazo legal.
Prazo
Deve
ser contado nos termos do Enunciado n. 710 do STF: “No processo penal,
contam-se os prazos da data da intimação, e não da juntada aos autos do
mandado ou da carta precatória ou de ordem”. A informação é relevante
para o Exame de Ordem, visto que a instituição costuma pedir o
oferecimento da peça no último dia de prazo – portanto, essencial saber
como contá-lo corretamente.
Se
a citação for feita por edital, o prazo correrá somente a partir do
comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído. Enquanto
não comparecer, o processo permanecerá suspenso, nos termos do art. 366
do CPP.
Resposta à acusação no juizado
O
artigo 396 é claro ao afirmar que a peça é cabível nos procedimentos
ordinário e sumário. No sumaríssimo, a Lei 9.099/95 prevê um trâmite
próprio para o processo, sem a existência de resposta à acusação.
Portanto, o dispositivo não é aplicável em processos que correm em
juizado.
Artigo 395 do CPP
Segundo
o entendimento majoritário, o “recebimento da denúncia se opera na fase
do art. 396 do Código de Processo Penal” (HC n. 138.089-SC, STJ, Rel.
Min. Felix Fischer, 5ª Turma, publicado no DJ em 22.3.2010). Com base
nisso, perfeitamente possível o pedido de rejeição da denúncia em
resposta à acusação.
A
OAB, na prova 2008.3, entendeu da mesma forma, tanto que exigiu, como
tese de defesa, o pedido de rejeição da inicial com base na inépcia da
denúncia (art. 395, I). Por isso, caso venha a ser cobrado novamente,
não obstante a divergência doutrinária sobre o tema, não deixe de alegar
o art. 395.
Nulidade (art. 564)
Também
na prova 2008.3, a OAB exigiu uma tese de nulidade, nos termos do art.
564, II, do Código de Processo Penal, pois a parte seria ilegítima (ao
final, comentários sobre a exceção de ilegitimidade). Portanto, caso
volte a cair uma resposta à acusação, por não existir qualquer óbice à
sua alegação, é possível que a banca traga alguma nulidade a ser
arguida.
Absolvição sumária
Prevista
no art. 397 do CPP, deve ser alegada exclusivamente em resposta à
acusação. Não pode o dispositivo, em hipótese alguma, fundamentar pedido
futuro de absolvição – em memoriais, por exemplo, quando a absolvição
deve ser requerida com base no art. 386.
A
absolvição sumária deve ser imposta quando: a) existir manifesta causa
excludente de ilicitude: basicamente, quando presente uma das três
hipóteses do art. 23 do CP (legítima defesa, estado de necessidade e
estrito cumprimento do dever legal); b) existir manifesta causa
excludente de culpabilidade: é o caso, por exemplo, do erro de proibição
(art. 21 do CP); c) o fato narrado evidentemente não constitui crime:
sendo o fato atípico, não há razão para que se dê continuidade ao
processo, sendo imperiosa a absolvição sumária; d) extinta a
punibilidade: é o caso, por exemplo, da prescrição. As causas extintivas
da punibilidade estão previstas no art. 107 do CP.
Sobre
as hipóteses do art. 397, algumas ressalvas devem ser feitas. A
primeira diz respeito ao inciso II, parte final, que trata da
inimputabilidade. Segundo o dispositivo, o juiz não pode, em absolvição
sumária, reconhecer a causa de isenção do art. 26 do CP. A segunda é em
relação ao inciso IV, que não se trata, em verdade, de sentença
absolutória, mas de declaratória de extinção da punibilidade. Contudo,
em apreço à redação legal, em prova, peça a absolvição.
Testemunhas e demais provas
O
art. 396-A afirma que, em resposta à acusação, “o acusado poderá arguir
preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer
documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar
testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando
necessário”.
Em
Exame de Ordem, a OAB tem fornecido os nomes das testemunhas que devem
ser arroladas na peça. No entanto, caso o enunciado não os forneça, não
deixe de arrolá-las. Para evitar a identificação da prova, diga apenas
“Nome ...”. Não invente nomes!
Ademais,
se o enunciado trouxer alguma situação em que a produção de prova
pericial ou documental seja favorável à defesa, não deixe de requerê-la,
pois certamente será objeto de quesito.
Exceções
As
exceções (art. 95 do CPP) devem ser processadas em apartado, segundo o
art. 396-A, § 1º, do CPP. Entretanto, em Exame de Ordem, não tem o menor
cabimento exigir do examinando a elaboração de duas peças distintas,
uma resposta e uma exceção. Caso o enunciado traga, por exemplo, uma
suspeição, alegue-a no próprio corpo da resposta à acusação, ainda que o
texto legal não ampare esse posicionamento. No Exame de Ordem 2008.3, a
OAB trouxe uma tese de ilegitimidade que devia ser alegada em exceção.
Entretanto, quem fez a exceção, reprovou. Por outro lado, quem alegou a
ilegitimidade no própria resposta, obteve a respectiva pontuação.
Modelo de resposta à acusação
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA … VARA CRIMINAL DA COMARCA …
Observação:
caso o problema não mencione qual é a Vara ou a Comarca, utilize
reticências. Não invente dados! Ademais, atenção à competência da JF.
Nome
…, já qualificado nos autos do processo n. …, vem, por seu advogado
(procuração anexada), perante Vossa Excelência, durante o prazo legal,
oferecer RESPOSTA À ACUSAÇÃO, com fundamento nos artigos 396 e 396-A do
Código de Processo Penal, pelas razões a seguir expostas:
Observações:
a) como o réu já foi qualificado na denúncia, não há razão para qualificá-lo novamente;
b)
por segurança, fundamente nos arts. 396 e 396-A, pois não sabemos qual
dos dois será o escolhido pela instituição, ainda que, a meu ver, a peça
esteja prevista no art. 396;
c) se o processo for de competência do júri, a fundamentação adequada é a do art. 406.
I. DOS FATOS
No
dia …, a ré foi presa em flagrante por estar supostamente oferecendo
serviços de natureza sexual, na Rua …, em companhia de outras mulheres.
Em
razão disso, o Ministério Público ofereceu denúncia em seu desfavor,
com fundamento do art. 230 do Código Penal, pela prática dos crimes de
prostituição e de rufianismo.
Observação: nos fatos, faça um breve resumo do enunciado. Não é o momento para alegar as teses.
II. DO DIREITO
Entrementes, a respeitável peça acusatória não merece prosperar, pelas razões a seguir:
a) da atipicidade da conduta
Como
é sabido, a prática da prostituição, no Brasil, não é crime, visto que
não existe qualquer previsão legal nesse sentido, não podendo outro
dispositivo ser aplicado por analogia. Portanto, trata-se de fato
atípico.
b) da inexistência da conduta do art. 230 do Código Penal
Quanto
à prática do rufianismo, não há qualquer prova nesse sentido, visto que
a ré nem sequer conhecia as demais garotas que estavam no “ponto” de
prostituição, tampouco tirava qualquer proveito do programa por elas
oferecido, como podem confirmar as testemunhas, “Nome ...” e “Nome ...”.
Observação:
na tese, vá direto ao assunto, sem rodeios. Na correção da prova, o
examinador procurará a tese e a devida fundamentação. O restante será
ignorado. Além disso, procure organizar as teses em tópicos, para
facilitar a localização pelo corretor.
III. DO PEDIDO
Diante
do exposto, requer seja absolvida sumariamente a ré, com fundamento no
art. 397, III, do Código de Processo Penal. Caso, no entanto, não seja o
entendimento de Vossa Excelência, requer a intimação e a oitiva das
testemunhas ao final arroladas.
Observação:
na defesa prévia (art. 55 da Lei 11.343/06) e na defesa preliminar
(art. 514 do CPP), o pedido será o de não recebimento da inicial, e não o
de absolvição sumária.
Pede deferimento.
Comarca …, data ….
Advogado …
Rol de Testemunhas
1. Nome …, endereço ….
2. Nome …, endereço ….
Obrigado pela publicação.
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