terça-feira, 16 de outubro de 2012

RELAXAMENTO

relaxamento da prisão em flagrante

Desde a prova 2006.1, quando iniciou o processo de unificação da prova, a OAB passou a pedir, para a segunda fase, peças que comportam muitas teses ao mesmo tempo, como, por exemplo, a resposta à acusação, os memoriais, a apelação e o rese.  O relaxamento da prisão em flagrante, por esse razão, era uma das peças menos prováveis para a segunda fase.

Contudo, para a surpresa de todos, no VI Exame de Ordem a FGV trouxe um caso de relaxamento. Por mais que, provavelmente, não volte a ser cobrado tão cedo, é importante que o examinando conheça esse importante instrumento previsto na CF/88 – até mesmo para utilizá-lo após a aprovação, em defesa dos seus clientes.

Pouco utilizado entre os profissionais, que acabam ajuizando liberdade provisória para qualquer situação, até mesmo porque, infelizmente, muitos não conhecem a sua função, o relaxamento serve para pedir a liberdade daquele que foi preso em flagrante ilegalmente.

Neste ponto, a diferença entre o relaxamento da prisão e a liberdade provisória fica bem visível: quando a prisão em flagrante for ILEGAL, utilize o relaxamento; quando for LEGAL, adote a liberdade provisória.

E o que seria, para termos a certeza de que a peça é o relaxamento, uma prisão ilegal? Para chegarmos à resposta, partiremos de dois exemplos bem simples:

Carlos é preso em flagrante por possuir, entre os seus pertences, um invólucro recheado com uma substância em pó, de cor branca. Pensando ser cocaína, o policial que fez a abordagem efetua a sua prisão em flagrante. Ao chegarem à delegacia, descobre-se que a substância é farinha de trigo. A autoridade policial, no entanto, mantém Carlos preso, sob a alegação de que, apesar de ser farinha, a substância se parece muito com cocaína.

Obviamente, a prisão de Carlos é ilegal, afinal, transportar farinha de trigo não configura fato típico. Logo, na hipótese, a prisão deveria ser atacada com o relaxamento.

Agora, vejamos outro caso:

Carlos, dias após o incidente da farinha, já solto, decide praticar um homicídio. Armado de um .38, ele dispara cinco tiros contra Chico, seu desafeto, que morre em virtude das lesões. No momento do crime, uma viatura da Polícia Militar estava passando pelo local, e, diante do ocorrido, o homicida foi preso em flagrante.

Na segunda hipótese, não vemos nenhuma ilegalidade, não é mesmo? Portanto, a prisão de Carlos é legal, e a sua liberdade deve ser pedida por liberdade provisória, e não por relaxamento.

Evidentemente, na segunda fase, a FGV não trará situações tão fáceis. Os exemplos acima são apenas para “esquentar”. Analisaremos, a partir de agora, situações de ilegalidade que provavelmente serão exigidas na prova.

Violação ao art. 302 do CPP

O CPP traz quatro hipóteses em que a prisão em flagrante pode ocorrer: a) no momento em que a infração penal está sendo praticada; b) logo após a prática da infração; c) quando, logo após a infração, o suspeito é perseguido pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa; d) quando, logo após a infração, o suspeito é preso é encontrado com instrumentos, armas, objetos ou papéis que se faça presumir ser o autor da ação.

Caso a prisão ocorra em contrariedade às hipóteses acima, não poderemos falar em flagrante – e, por esse motivo, a prisão em flagrante será ilegal. A título de exemplo, vale mencionar a seguinte situação, que, não só já caiu na OAB, como em alguns concursos (foi o tema da questão discursiva da última prova para delegado em Rondônia):

Carlos, no dia 05 de maio de 2012, desfere quinze facadas contra José, causando-lhe a morte. Cinco dias depois, Carlos apresenta-se espontaneamente à autoridade policial, que efetua a sua prisão em flagrante.

Pergunto: a prisão havia acabado de ocorrer? Carlos foi pego após tentativa de fuga? Ele foi pego, logo após o crime, com algum instrumento que o incriminasse? Não, não e não, né? Portanto, a prisão em flagrante foi ilegal, devendo ser relaxada.

Entretanto, atenção: se existir mandado de prisão contra o acusado em virtude da decretação de prisão preventiva, a prisão será legal. Contudo, a prisão não será em flagrante.

Por fim, vale frisar: nos crimes permanentes, a prisão em flagrante pode ocorrer enquanto o crime perdurar. Ex.: extorsão mediante sequestro.

Outras hipóteses de prisão ilegal

Ao contrário do que é dito em muitos manuais, as hipóteses de prisão ilegal não são somente aquelas em que há violação do art. 302 do CPP. Vejamos alguns exemplos em que o relaxamento é cabível:

a) Inobservância de procedimento relativo ao flagrante: a prisão em flagrante não se resume ao ato de voz de prisão. Posteriormente, diversos atos devem ser praticados, tais como: a comunicação da prisão em flagrante ao juiz competente, ao MP e, caso o autuado não informe   o nome do seu advogado, à Defensoria Pública; a entrega de nota de culpa ao preso etc. Os procedimentos gerais estão entre os artigos 304 a 309 do CPP.

b) Nos crimes de ação penal privada ou pública condicionada à representação, caso a vítima ou o representante legal, em até 24 horas após a prisão, não se manifeste favoravelmente à lavratura do auto de prisão em flagrante, o preso deverá ser colocado em liberdade. Há julgados contrários à esta tese. Contudo, como estamos falando em Exame de Ordem, em que deve ser alegado tudo o que for de interesse do acusado, caso surja uma questão nesse sentido, peça o relaxamento.

c) A prisão será ilegal quando houver o flagrante for preparado ou provocado, pois o fato será atípico (crime impossível, art. 17, CP). Exemplo: Carlos, policial disfarçado, com inúmeros outros igualmente camuflados, exibe relógio de alto valor em via pública, aguardando que alguém tente assaltá-lo. Apontada a arma para a pessoa que serve de isca, os demais policiais prendem o agente (ex. adaptado do manual do Nucci). Por ser impossível a consumação do crime, o fato é atípico, e a prisão em flagrante, caso ocorra, é ilegal.

d) A prisão em flagrante também será ilegal quando a situação for forjada. Ex.: Carlos, em abordagem policial, esconde 1kg de cocaína dentro do veículo de José, e, em seguida, efetua a sua prisão em flagrante, dizendo que a droga pertence ao proprietário do automóvel.

e) Excesso de prazo para a conclusão do inquérito: a autoridade policial tem o prazo de 10 dias para a conclusão do IP. Caso ultrapasse o prazo, a prisão passa a ser ilegal. O prazo deve ser contado com a inclusão do primeiro dia, ainda que a prisão ocorra faltando poucos minutos para o seu término (ex.: prisão às 23h30min).

f) Prisão em flagrante decorrente de prova inegavelmente ilícita: é o caso cobrado no último Exame de Ordem, em que o acusado foi obrigado a fazer o teste do bafômetro, o que, como sabemos, é vedado. Como a prisão ocorreu com base em prova ilegal, a prisão deve ser relaxada.

g) Incomunicabilidade do preso: também caiu na última prova. É vedada a incomunicabilidade entre o preso e os seus familiares e o advogado. Logo, se imposta tal situação ao preso, a prisão passa a ser ilegal.

Além dos exemplos acima, há uma porção de outras situações em que a prisão pode ser considerada ilegal. Para não ter erro, caso caia uma situação de prisão em flagrante em sua prova, busque descobrir o que a legislação fala sobre o assunto. Se houver violação ao texto legal, a prisão será, evidentemente, ilegal.

Para encerrar este tópico, importante dizer que, ao contrário da liberdade provisória, o relaxamento não é vedado em hipótese alguma, pouco importando a natureza do crime. Sendo a prisão ilegal, o relaxamento será cabível.

Resumo

1. Fundamento legal: art. 5º, LXV, da CF/88 e art. 310, I, do CPP.

2. Conceito: é a peça cabível para pedir a liberdade de quem foi preso em flagrante de forma ilegal.

3. Momento: a ilegalidade pode ocorrer desde o início da prisão, como no caso do fato atípico, bem como durante os procedimentos seguintes à voz de prisão, como a falta de comunicação da prisão ao juiz competente.

4. Artigos que o examinando deve utilizar para avaliar se a prisão é ilegal:
em regra, artigos 301 a 310 do CPP.

5. Peças que podem gerar confusão: a liberdade provisória e habeas corpus. Para não errar, tenha em mente: a liberdade provisória caberá quando a prisão for LEGAL e os requisitos da prisão preventiva (art. 312 do CPP) não estiverem presentes. Já o HC, na hipótese da prisão em flagrante, caberá quando o pedido de relaxamento ou liberdade provisória tiver sido negado pelo juiz que o apreciou.

6. Quando caiu:
no VI Exame de Ordem (FGV).

7. A quem deve ser dirigido: ao juiz criminal competente. Se for crime doloso contra a vida, ao juiz da Vara do Júri. Se não for doloso contra a vida, ao juiz da Vara Criminal. Se for crime de competência da JF, juiz federal da respectiva vara. Cuidado com o que dizem alguns manuais: não enderece ao “DIPO”, espécie de departamento de inquérito policial existente em São Paulo.

8. Pedido: deve ser pedido o relaxamento da prisão em flagrante e a expedição de alvará de soltura.

Relaxamento da prisão em flagrante

Ao receber o auto de prisão em flagrante, pode o juiz, de ofício, segundo o art. 310 do CPP: a) relaxar a prisão em flagrante ilegal; b) converter a prisão em flagrante em preventiva; c) conceder liberdade provisória.

Na liberdade provisória, a prisão em flagrante ocorreu dentro da legalidade. No entanto, por estarem ausentes os requisitos da prisão preventiva, não existe razão para que o sujeito aguarde preso o seu julgamento.

Para a população em geral, a soltura do acusado de um crime pode parecer injusta. No entanto, por apreço ao princípio da presunção de inocência – ou de não culpabilidade (art. 5º, LVII, da CF) -, até que ocorra a efetiva condenação, a prisão não pode ser imposta, salvo se existir alguma utilidade prática para a sua aplicação, conforme art. 312 do CPP: A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. 

Comparo a prisão cautelar às algemas, que devem ser utilizadas somente quando existir algum objetivo útil – evitar a fuga, por exemplo -, e não como instrumento de condenação prévia. Sobre o tema, merece transcrição a Súmula Vinculante n. 11, do STF: Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Presente, contudo, uma das hipóteses do art. 312, pode o juiz converter a prisão em flagrante em prisão preventiva, permanecendo o sujeito preso. Entretanto, atenção à alteração ocorrida em 2011, com o advento da Lei 12.403. De acordo com a nova redação, a prisão preventiva será cabível quando inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares alternativas à prisão, previstas no art. 319 do CPP.

O novo dispositivo reforça a ideia de que a prisão deve ser medida excepcional, quando nenhuma outra for suficiente para que se alcance o objetivo prático que se busca. Se, por exemplo, o recolhimento domiciliar no período noturno for eficaz para assegurar a ordem pública, por qual razão impôr a prisão, medida cautelar mais gravosa do nosso ordenamento?

Por fim, se a prisão em flagrante for ilegal, deve o juiz relaxá-la. O relaxamento tem previsão constitucional, no art. 5º, LXV. A ilegalidade pode decorrer de uma série de motivos, não existindo um rol taxativo. Todavia, a título de exemplo, vale mencionar algumas hipóteses: a prisão em flagrante daquele que se apresenta espontaneamente, a ausência de comunicação da prisão ao juiz competente, o excesso de prazo para a adoção de algum procedimento etc.

Na verdade, se observarmos as situações em que a prisão em flagrante é ilegal, quase todas decorrem de violação ao art. 302 do CPP, salvo aquelas referentes ao procedimento de lavratura do respectivo auto. Portanto, é a matriz para qualquer pedido de relaxamento.

Ainda que o relaxamento deva ocorrer de ofício, quando o juiz estiver diante de uma ilegalidade na prisão, nada impede que o preso, em defesa dos seus interesses, requeira judicialmente a sua concessão. Com isso em mente, partiremos para a primeira peça prática do nosso manual: o relaxamento da prisão em flagrante.

O pedido de relaxamento é um requerimento simples, em uma única peça. O endereçamento é para o juiz de primeiro grau, salvo quando a ilegalidade partir dele, hipótese em que a liberdade deverá ser pedida em habeas corpus, à instância superior.

A peça deve ser fundamentada nos artigos 310, I, do CPP e 5º, LXV, da CF. É necessário qualificar o requerente. Caso a sua elaboração se dê em prova, utilize somente os dados fornecidos no enunciado. Jamais invente informações!

Nos fatos, basta um breve resumo da situação. No tópico “do direito”, discorra sobre a ilegalidade da prisão. Como o relaxamento tem como objetivo, somente, a liberdade do requerente, não é o momento adequado para discutir o mérito da causa, a não ser que influencie na prisão em flagrante (ex.: a demonstração de que o fato é atípico).

No pedido, basta requerer o reconhecimento da ilegalidade da prisão, e, é claro, a expedição de alvará de soltura. Sempre que a situação tiver, como objetivo, a soltura do acusado, peça o alvará.

O relaxamento é facilmente identificável, pois, em provas, o enunciado deixará bem claro que a prisão é ilegal. Não sendo o caso de ilegalidade, peça a concessão de liberdade provisória, por ausência dos requisitos da prisão preventiva. Por fim, se o enunciado trouxer situações de ilegalidade e de legalidade, requeira o relaxamento cumulado à liberdade provisória. Feitas as considerações gerais, vamos à prática!

(OAB/FGV – VII Exame de Ordem) No dia 10 de março de 2011, após ingerir um litro de vinho na sede de sua fazenda, José Alves pegou seu automóvel e passou a conduzi-lo ao longo da estrada que tangencia sua propriedade rural. Após percorrer cerca de dois quilômetros na estrada absolutamente deserta, José Alves foi surpreendido por uma equipe da Polícia Militar que lá estava a fim de procurar um indivíduo foragido do presídio da localidade. Abordado pelos policiais, José Alves saiu de seu veículo trôpego e exalando forte odor de álcool, oportunidade em que, de maneira incisiva, os policiais lhe compeliram a realizar um teste de alcoolemia em aparelho de ar alveolar. Realizado o teste, foi constatado que José Alves tinha concentração de álcool de um miligrama por litro de ar expelido pelos pulmões, razão pela qual os policiais o conduziram à Unidade de Polícia Judiciária, onde foi lavrado Auto de Prisão em Flagrante pela prática do crime previsto no artigo 306 da Lei 9.503/1997, c/c artigo 2º, inciso II, do Decreto 6.488/2008, sendo-lhe negado no referido Auto de Prisão em Flagrante o direito de entrevistar-se com seus advogados ou com seus familiares. 

Dois dias após a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante, em razão de José Alves ter permanecido encarcerado na Delegacia de Polícia, você é procurado pela família do preso, sob protestos de que não conseguiam vê-lo e de que o delegado não comunicara o fato ao juízo competente, tampouco à Defensoria Pública. 

Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso  concreto acima, na qualidade de advogado de José Alves, redija a peça cabível, exclusiva de advogado, no que tange à liberdade de seu cliente, questionando, em juízo, eventuais ilegalidades praticadas pela Autoridade Policial, alegando para tanto toda a matéria de direito pertinente ao caso.

Modelo de peça

Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da … Vara Criminal da Comarca …

Como o enunciado não faz menção à Comarca, utilize apenas reticências. Se o caso fosse de crime doloso contra a vida, o endereçamento seria ao juiz da “Vara do Júri”; se de competência da Justiça Federal, “Juiz Federal da … Vara Criminal da Justiça Federal da Seção Judiciária de ...”.

José Alves, nacionalidade …, estado civil …, profissão …, residente e domiciliado no endereço …, por seu advogado, que esta subscreve (procuração anexada), vem, perante Vossa Excelência, requerer o RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE, com fundamento no art. 5º, LXV, da Constituição Federal, e art. 310, I, do Código de Processo Penal, pelas razões a seguir expostas:

Atenção à correta fundamentação da peça! Ademais, ao qualificar o requerente, não invente dados. Por mais que o enunciado diga que a prisão ocorreu em sua “propriedade rural”, qualificá-lo como “agricultor” pode resultar em identificação da peça.

I. DOS FATOS

No dia 10 de março, o requerente foi preso em flagrante após ser obrigado por policiais militares a se submeter ao exame de alcoolemia em aparelho de ar alveolar.

Decorridos dois dias da prisão, o requerente permanece preso na Delegacia de Polícia, incomunicável, e sem que a Defensoria Pública tenha sido comunicada da prisão, não obstante a não indicação de advogado.

Não perca muito tempo descrevendo os fatos. Basta o resumo do enunciado, pois não há atribuição de pontos ao que for dito neste tópico.

II. DO DIREITO

Entrementes, Excelência, a prisão em flagrante não pode prosperar, visto que evidentemente ilegal.

Conforme relatado, o requerente foi compelido a realizar o chamado “teste do bafômetro” contra a sua vontade, em violação ao artigo 5º, LXIII, da Constituição Federal, que prevê o direito de não produzir provas contra si.

Portanto, a prova que ensejou a prisão em flagrante do requerente é ilícita, nos termos do art. 5º, LVI, da Constituição Federal e do art. 157 do Código de Processo Penal, inexistindo razão para que a prisão subsista.

Ademais, não obstante a ilegalidade da prisão por licitude da prova, a autoridade policial impôs a incomunicabilidade ao requerente, que está inacessível aos seus familiares e ao seu advogado, em clara violação ao art. 5º, LXIII, da CF/88, bem como ao art. 7º, III, do Estatuto da OAB (Lei 8.906/94). Destarte, está demonstrado claramente mais um vício no auto de prisão em flagrante.

Por derradeiro, a autoridade policial não realizou a comunicação, no prazo previsto no art. 306, § 1º, do Código de Processo Penal, da Defensoria Pública, configurando mais uma causa de mácula ao auto de prisão em flagrante.

Dessa forma, a prisão em flagrante é ilegal por três razões: a) a ilicitude da prova; b) a incomunicabilidade; c) a ausência de comunicação à Defensoria Pública.

No tópico “do direito”, é importante ser objetivo em suas razões. O tempo de prova é curto e o espaço para a elaboração da redação é limitado. Além disso, a correção é bem objetiva. O examinador procurará, em sua prova, somente as respostas do gabarito. O restante será simplesmente ignorado. Além disso, em meio a muita informação, existe o risco de que a resposta não seja encontrada por quem corrigir a prova. Basta escrever umas poucas palavras sobre a tese e fundamentá-la corretamente.

III. DO PEDIDO

Diante do exposto, requer seja reconhecida a ilegalidade da prisão, para que se conceda o relaxamento da prisão em flagrante. Pede, ademais, a expedição de alvará de soltura em favor do requerente.

O pedido corresponde à tese. Se a peça tem como objetivo o relaxamento da prisão, o pedido não poderia ser outro. Não se esqueça, além disso, de pedir a expedição de alvará. Na prática, não é necessário. Se o juiz reconhecer a ilegalidade, o alvará será expedido. Contudo, em provas, é imprescindível que se peça.

Pede deferimento.

Comarca …, data ….

Advogado ….

Nunca, em hipótese alguma, informe ou seu nome ou a cidade em que está, sob pena de anulação da prova.

No dia 10 de março de 2011, após ingerir um litro de vinho na sede de sua fazenda, José Alves pegou seu automóvel e passou a conduzi-lo ao longo da estrada que tangencia sua propriedade rural. Após percorrer cerca de dois quilômetros na estrada absolutamente deserta, José Alves foi surpreendido por uma equipe da Polícia Militar que lá estava a fim de procurar  um  indivíduo  foragido  do  presídio  da  localidade. Abordado pelos policiais, José Alves saiu de seu veículo trôpego e exalando forte odor de álcool, oportunidade em que de maneira incisiva,  os  policiais  lhe  compeliram  a  realizar  um  teste  de  alcoolemia em aparelho de ar alveolar. Realizado o teste, foi constatado que José Alves tinha concentração de álcool de um  miligrama  por  litro  de  ar  expelido  pelos  pulmões,  razão  pela  qual  os  policiais  o  conduziram  à Unidade de Polícia Judiciária, onde foi lavrado Auto de Prisão em Flagrante pela prática do crime previsto no  artigo  306  da  Lei  9.503/1997,  c/c  artigo  2º,  inciso  II,  do  Decreto  6.488/2008,  sendo-lhe  negado  no referido  Auto  de  Prisão  em  Flagrante  o  direito  de  entrevistar-se  com  seus  advogados  ou  com  seus familiares.  Dois dias após a lavratura do Auto de Prisão  em  Flagrante,  em  razão  de  José  Alves  ter  permanecido encarcerado  na  Delegacia  de  Polícia,  você  é  procurado  pela  família  do  preso,  sob  protestos  de  que  não conseguiam vê-lo e de que o delegado não comunicara o fato ao juízo competente, tampouco à Defensoria Pública.  Com base somente nas informações de que dispõe  e  nas  que  podem  ser  inferidas  pelo  caso concreto acima, na qualidade de advogado de José Alves, redija a peça cabível, exclusiva de advogado, no que tange à  liberdade  de  seu  cliente,  questionando,  em  juízo,  eventuais  ilegalidades  praticadas  pela  Autoridade Policial, alegando para tanto toda a matéria de direito pertinente ao caso.

No texto acima, a ilegalidade na prisão ficou bem evidente pelas seguintes razões: a) o preso foi compelido (forçado) a fazer o teste do bafômetro, e, em decorrência disso, a prova, que é ilícita, não poderia ter causado a prisão; b) houve a imposição de incomunicabilidade ao preso; c) não ocorreu a comunicação da prisão ao juiz, ao MP e à Defensoria. Destarte, a peça adequada seria, inegavelmente, o relaxamento da prisão em flagrante.

Contudo, o problema não fez qualquer menção aos requisitos da prisão preventiva (art. 312 do CPP) – portanto, ausentes no caso, pois o que é vedado é a criação de dados, e não a interpretação de omissão de determinada informação.

Art. 312.  A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Logo, por também ser “adequada” (termo utilizado no edital), a liberdade provisória poderia ser a peça escolhida pelo examinando. Haveria para quem a fizesse, evidentemente, prejuízo à nota, pois as ilegalidades deveriam ser abordadas. No entanto, a prova não poderia deixar de ser corrigida, como ocorreu.

Com base no enunciado, posso afirmar, sem sombra de dúvidas: quem fez relaxamento, liberdade provisória ou a cumulação de pedidos, escolheu a via adequada para confrontar o caso trazido no problema, sendo imperiosa a correção da prova.

Quanto à cumulação, na prática, nenhum profissional optaria, somente, pelo relaxamento, e a razão é simples: caso o juiz não reconheça a ilegalidade, a prisão deverá ser atacada por ausência de requisitos da prisão preventiva. Portanto, a cumulação era perfeitamente possível – e, a meu ver, o mais correto a ser feito, sem que houvesse prejuízo a quem optou somente pelo relaxamento, pois teve como base os temas expressamente trazidos.

Entretanto, por equívoco de quem elaborou a prova, a instituição deu zero a quem fez liberdade provisória ou relaxamento cumulado com liberdade. Digo de quem desenvolveu o teste porque, em correção preliminar, a determinação da FGV é para que o corretor não faça interpretações. O padrão de prova deve ser seguido ao pé da letra. Dessa forma, o erro foi de quem elaborou o gabarito (padrão), e não de quem fez a correção.

No último Exame de Ordem, refiz a prova. Por ter obtido aprovação há quatro anos, na época do CESPE, tive que me submeter ao novo formato de prova, para entender como as coisas funcionam atualmente – caso contrário, o nobre leitor teria a opinião de alguém desatualizado. Para não dar dicas furadas, encarei a OAB novamente.

Ao ler o enunciado, tive a certeza de que, em razão da forma clara com que as ilegalidades foram trazidas, a liberdade provisória não seria objeto de quesito. Todavia, como a ideia da experiência era identificar a melhor forma de se obter a aprovação, paguei para ver e fiz a cumulação de relaxamento com liberdade.

Após a prova, reunido com alguns amigos, comentei: do jeito que a correção preliminar é feita de forma mecânica, é bem provável que a FGV anule a prova de quem fez a cumulação. Entretanto, mesmo acreditando em uma possível anulação, não tive a menor dúvida de que o erro seria desfeito em sede de recurso, quando a correção é mais criteriosa.

Na publicação do resultado, confirmei a minha suspeita, e acabei reprovado por anulação da peça. Por mais que isso fosse previsível, e mesmo sendo mera experiência, admito que fiquei bastante revoltado com a injustiça cometida pela instituição. Não por mim, é claro, mas pelos examinandos por aí que, sem ter a certeza de que a FGV voltaria atrás, como eu tinha, sofreram pela reprovação.

Por mais que erros possam ocorrer na elaboração de uma prova, é inaceitável que a pessoa – ou a equipe - que a elaborou não tenha previsto que isso ocorreria. Como comentei, no momento em que fiz a minha peça, imaginei que a peça poderia ser anulada por erro no padrão. Logo, a mesma previsão deveria ter sido feita pela FGV. Os nervos de quem fez a prova poderiam ter sido poupados.

Após os recursos, tive a minha peça corrigida, e obtive, como nota final, 9,7. Espero que a nova correção tenha alcançado a todos os injustiçados. No entanto, em exames futuros, tenhamos em mente:

1º No Exame de Ordem, trabalhe com informações expressas. Ignore o que não foi dito. Aparentemente, a FGV não é de fazer pegadinhas. O que é pedido é exatamente o que está evidente.

2º Se, no futuro, a instituição pedir para que a prisão em flagrante seja atacada, decida da seguinte forma: se houver menção à ilegalidade, ainda que seja uma só, faça o relaxamento, sem cumulação. Opte pela liberdade provisória em uma única hipótese: se houver menção expressa à falta dos requisitos da preventiva, sem discussão de ilegalidades.

Por fim, para quem optou somente pela liberdade provisória e permaneceu reprovado, sugiro que requeira, em petição à OAB, uma nova correção, e que, em último caso, busque o Poder Judiciário. Sugiro uma solução administrativa pelas seguintes razões: a) em provas passadas, soube de casos de examinados que, em pedido à OAB, conseguiram reverter situações de inegável injustiça; b) o Poder Judiciário não costuma interferir em concursos. Por isso, a chance de que um MS dê certo é muito pequena.

Judicial ou administrativamente, fundamente o seu pedido no próprio edital, que diz, em seu item 4.2.6:

Nos casos  de  propositura  de  peça  inadequada  para  a  solução  do  problema  proposto, considerando,  neste  caso,  aquelas  peças  que  justifiquem  o  indeferimento  Iiminar  por  inépcia, principalmente quando se tratar de ritos procedimentais diversos, como também não se possa aplicar o princípio  da  fungibilidade  nos  casos  de  recursos,  ou  de  apresentação  de  resposta  incoerente  com situação  proposta  ou  de  ausência  de  texto,  o  examinando  receberá  nota  ZERO  na  redação  da  peça profissional ou na questão.

A liberdade provisória, por mais que, no caso trazido, não seja a peça mais vantajosa ao acusado, pois havia ilegalidades na prisão, não pode ser considerada inadequada, visto que  ausentes os requisitos da prisão preventiva. Ademais, em caso de prisão ilegal arguida erroneamente em liberdade provisória, o pedido não deixaria de ser apreciado pelo magistrado. Logo, não é caso de inadequação, inépcia ou impossibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade, sendo vedada, portanto, a nota zero.

Nenhum comentário:

Postar um comentário