terça-feira, 16 de outubro de 2012

LIBERDADE PROVISORIA

Liberdade Provisória

Além da possibilidade de relaxamento da prisão em flagrante e de sua conversão em prisão preventiva, pode o magistrado, de ofício, conceder liberdade provisória, desde que ausentes os requisitos da prisão preventiva (arts. 310 e 312 do CPP).

No entanto, nada impede que o sujeito que está preso peça, por petição endereçada ao juiz competente, a sua concessão, para que aguarde o julgamento em liberdade. Portanto, com base no art. 310 do CPP, três são as opções após o flagrante, sendo que duas são interessantes ao preso:

1ª A conversão da prisão: presente um dos requisitos da preventiva (art. 312), pode o juiz converter a prisão em flagrante em prisão preventiva, devendo o preso, neste caso, permanecer recolhido. Cabe HC contra a decisão, endereçado à instância superior (TJ, se a decisão partiu de juiz estadual de primeira instância). Por não ser benéfica ao preso, não existe interesse para que seja por ele pedida.

2ª O relaxamento: sendo a prisão ILEGAL, deve ser a prisão imediatamente relaxada. O pedido de  reconhecimento da ilegalidade pode ser feito em petição endereçada ao juiz competente, intitulada “relaxamento da prisão em flagrante”. Se a ilegalidade partir de juiz, cabe HC endereçado à instância superior. Como o que se discute é a ilegalidade da prisão em flagrante, não há motivo para adentrar nos requisitos da preventiva (art. 312), como ocorre na liberdade provisória.

3ª A concessão de liberdade provisória: nesta hipótese, a prisão em flagrante ocorreu dentro da LEGALIDADE. Entretanto, não estão presentes os requisitos para a conversão em prisão preventiva, devendo o sujeito aguardar o julgamento em liberdade. O pedido deve ser fundamentado com base na ausência de requisitos da prisão preventiva – ou seja, deve o advogado demonstrar, em sua petição, que nenhuma das hipóteses do art. 312 está presente.

Dessa forma, percebe-se que os pedidos de relaxamento e de liberdade provisória não se confundem. Enquanto este serve para a discussão da ausência dos requisitos da preventiva, aquele tem como base a ilegalidade da prisão em flagrante. Veremos, a seguir, as peculiaridades que envolvem a liberdade provisória.

Sobre a prisão preventiva

A condição de inocente só deixa de existir após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Por essa razão, a privação da liberdade durante o processo é medida excepcional, que deve ocorrer somente em situações específicas. Como regra, o acusado deve aguardar o julgamento solto, e se, eventualmente, vier a ser condenado, aí sim a prisão poderá ser imposta, mas como pena.

No caso da prisão preventiva, o CPP traz, em rol taxativo, as hipóteses em que é justificável: a) para assegurar a ordem pública e a ordem econômica; b) por conveniência da instrução criminal; c) para assegurar a aplicação da lei penal; d) quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria; e) quando não forem inadequadas ou suficientes as medidas cautelares alternativas à prisão (art. 310, II); f) quando descumpridas as medidas cautelares (312, parágrafo único).

Importante observar que a prisão cautelar deve ter um objetivo útil (por exemplo, assegurar a ordem pública). Por ser anterior ao trânsito em julgado da sentença condenatória, não pode ser adotada como punição ao acusado, como ocorre com a prisão decorrente de imposição de pena. Não existindo um dos requisitos previstos no art. 312, a prisão preventiva não pode ocorrer.

A imposição de prisão preventiva não influencia na formação da culpa. Pode o juiz, durante o processo, decretá-la como garantia da ordem pública, mas, ao final, absolver o acusado, sem qualquer prejuízo.

Ademais, os requisitos da prisão preventiva podem surgir ou deixar de existir a qualquer momento. Se um acusado responde ao processo em liberdade, mas passa a pôr em risco a ordem econômica, o juiz pode decretar a prisão preventiva. Da mesma forma, se, inicialmente, existia um dos requisitos, e este deixou de existir, a juiz deve revogá-la. No entanto, a peça intitulada liberdade provisória deve ser utilizada somente na hipótese de prisão em flagrante. Se, durante o processo, o requisito  que ensejou a prisão deixar de existir, a peça adequada é a revogação da prisão preventiva, e não a liberdade provisória.

Por fim, o art. 313 traz as situações em que a prisão preventiva é cabível. O dispositivo foi introduzido pela Lei 12.403/11.

Vedação à liberdade provisória

Antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, ninguém pode ser preso, salvo em hipóteses específicas, em que a prisão é adotada para que se busque determinado fim prático ao processo ou à sociedade, e não como punição, como ocorre no cumprimento de pena.

Compete ao juiz analisar a presença ou não dos requisitos autorizadores da prisão cautelar. Imagine a seguinte situação: uma pessoa é presa com 1kg de cocaína. Além da grande quantidade, fica demonstrado que, se colocada em liberdade, ela continuará vendendo drogas. Neste caso, justificável a prisão cautelar sem que exista a condenação criminal, nos termos do art. 312, pois a liberdade do acusado pode gerar ainda mais prejuízos à sociedade.

Por outro lado, imagine que um sujeito é preso em flagrante com cinco cigarros de maconha em seu bolso. Na delegacia, as informações são contraditórias – enquanto algumas testemunhas dizem se tratar de traficante, outras afirmam que é mero usuário. O preso em flagrante possui residência fixa, trabalha e não existe qualquer evidência de que um dos requisitos da preventiva está presente. Com base nisso, nada mais justo que aguarde o julgamento em liberdade, pois não há qualquer motivo para que a sua prisão seja mantida. Se, futuramente, ficar demonstrado que é traficante, cumprirá sua pena. Caso contrário, será absolvido e permanecerá solto.

No entanto, o legislador pátrio, no art. 44 da Lei 11.343/06, vedou a concessão de liberdade provisória aos acusados de tráfico de drogas, pouco importando se presentes ou não os requisitos da prisão preventiva. Ainda que não exista um objetivo prático para a prisão, o acusado deve permanecer preso, em inegável violação ao princípio da presunção de inocência ou de não culpabilidade.

A vedação à liberdade provisória está presente em outros dispositivos legais, a exemplo do art. 21 da Lei 10.826/03, declarado inconstitucional pelo STF: Insusceptibilidade de liberdade provisória quanto aos delitos elencados nos arts. 16, 17 e 18. Inconstitucionalidade reconhecida,visto que o texto magno não autoriza a prisão ex lege, em face dos princípios da presunção de inocência e da obrigatoriedade de fundamentação dos mandados de prisão pela autoridade judiciária competente (ADI 3.112/DF).

Nos crimes de lavagem de capitais, a concessão de liberdade provisória também era vedada (art. 3º da Lei 9.613/98). Todavia, no dia 09 de julho de 2012, entrou em vigor a Lei 12.683, que revogou o dispositivo.

Medidas cautelares

Para reforçar o entendimento de que a prisão anterior à condenação é medida excepcional, foram incluídas no CPP, no ano de 2011, as medidas cautelares diversas do encarceramento (art. 319). São elas: a) comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; b) proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; c) proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; d) proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; e) recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; f) suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; g) internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; h) fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; i) monitoração eletrônica.

Segundo o art. 310, II, a conversão da prisão em flagrante em preventiva ocorrerá somente quando insuficientes ou inadequadas as medidas cautelares alternativas. Portanto, a prisão passou a ser aplicável alternativa e subsidiariamente à medida cautelar, quando esta não alcançar o objetivo desejável.

O pedido de aplicação de medida cautelar diversa da prisão pode ser pedida na petição de liberdade provisória. Caso o beneficiado pela medida cautelar deixar de cumpri-la, pode o juiz decretar a preventiva, com fundamento no art. 312, parágrafo único, do CPP.

Fiança

As hipóteses de vedação de fiança estão previstas no artigo 323 CPP. Isso não significa, no entanto, que as situações lá previstas não são passíveis de liberdade provisória. A vedação incide somente sobre o arbitramento de fiança, que, em crimes considerados mais graves, a exemplo do racismo, é proibido. A redação do art. 323 é praticamente a transcrição das hipóteses de inafiançabilidade previstas na CF. Ademais, o art. 324 traz outras situações em que a fiança não pode ser concedida.

Nos crimes cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a quatro anos, a fiança poderá ser arbitrada pela autoridade policial. Em todos os demais casos, a concessão de fiança deverá ser requerida ao juiz competente.

Sendo o crime for afiançável, a liberdade provisória será "com fiança", com pedido de arbitramento. Caso contrário, não deve ser pedida a concessão de fiança, pois vedada, como ocorre, por exemplo, no caso de crime hediondo.

Portanto, a liberdade provisória pode ser requerida, em petição endereçada ao juiz competente, quando ausentes os requisitos da prisão preventiva. Será cabível somente nos casos de prisão em flagrante, ocorrida dentro da legalidade – se ilegal, a peça adequada é o relaxamento. Se a prisão for decretada ao longo do processo, a sua revogação poderá ser requerida em pedido de revogação da prisão preventiva, ou, até mesmo, em HC.

A prisão domiciliar

Para encerrarmos o assunto, importante transcrever o art. 318 do CPP, que traz as hipóteses de prisão domiciliar: Art. 318.  Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: I - maior de 80 (oitenta) anos; II - extremamente debilitado por motivo de doença grave; III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; IV - gestante a partir do 7o (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco.

Neste caso, não se trata de medida cautelar diversa da prisão, como aquelas previstas no art. 319. A prisão domiciliar é cabível quando a prisão preventiva oferecer grave risco à pessoa – imaginem um homem de 85 anos recolhido em um presídio, aguardando o julgamento. Não se trata, é claro, de autorização para a prática de delitos. Contudo, não há cabimento em impôr à pessoa, em situação de extrema fragilidade, medida capaz de causar-lhe, até mesmo, a morte. 

Modelo de liberdade provisória

Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da … Vara Criminal da Comarca …

Observações:

1ª O uso do “doutor”: não obstante a minha imensa admiração pela magistratura, não me agrada a redação “senhor doutor”, pois acho que a expressão empobrece o texto. No entanto, fiquem à vontade para utilizá-lo. Tanto em prova quanto na prática, a ausência ou a presença do termo não influenciam em nada.

2ª Atenção ao endereçamento: se o crime for doloso contra a vida, “Juiz de Direito da … Vara do Júri”. Se de competência da Justiça Federal, o endereçamento deve ser, evidentemente, para a JF.

3ª Identificação: muito cuidado em provas! Se o problema não mencionar a Comarca, não a invente, sob pena de ter a prova anulada por identificação.

Nome, nacionalidade, estado civil, profissão, residente em endereço, vem à presença de Vossa Excelência, por seu advogado (procuração anexada), com fundamento nos artigos 5º LXVI, da Constituição Federal e 321 do Código de Processo Penal, requerer a CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA, pelas razões a seguir: 

Observações:

1ª Não invente dados! Se o enunciado não mencionar o nome do requerente ou demais dados, não os invente (ex.: “Fulano”), pois a sua prova pode ser anulada.

2ª Atenção à fundamentação! 

I. DOS FATOS

No dia …, o requerente foi preso em flagrante por supostamente estuprar a adolescente …, de 14 anos de idade.

No entanto, não estão presentes os requisitos da prisão preventiva, visto que possui residência fixa, trabalha e que não há qualquer risco de ofensa ao que está previsto no art. 312 do CPP.

Observação: não perca muito tempo ao relatar os fatos. Basta um breve resumo. O motivo é simples: a banca não atribui pontos ao tópico.

II. DO DIREITO

Por essa razão, a liberdade provisória é a medida que se faz necessária, visto que ausentes os requisitos ensejadores da prisão preventiva, conforme art. 312 do CPP.

Como já relatado, o requerente possui residência fixa, trabalha e não há qualquer indício de que ponha em risco a ordem pública, a ordem econômica ou a persecução penal. Ademais, não há indícios suficientes de autoria para a decretação de sua prisão.

Observação: seja bem direto em suas razões. Diga expressamente a tese e faça menção ao dispositivo legal que a fundamenta. No caso do Exame de Ordem, a correção é uma verdadeira caça às palavras: se o que está no gabarito estiver na prova, a pontuação será dada.

III. DO PEDIDO

Diante do exposto, requer seja concedida a liberdade provisória ao requerente, bem como seja expedido o respectivo alvará de soltura.

Observação: o pedido é a consequência lógica da exposição de razões no tópico “dos fatos”. Se  demonstrado que os requisitos da prisão preventiva estão ausentes, o pedido deve ser a concessão de liberdade provisória (ou a revogação da prisão preventiva, conforme distinção feita acima). Sempre que o pedido tiver como objetivo a soltura, deve ser pedida a expedição de alvará de soltura.

Pede deferimento.

Comarca …, data ….

Advogado.

Observação: nunca mencione o seu nome ou invente a Comarca, sob pena de anulação da prova.



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