O
recurso em sentido estrito merece atenção especial daqueles que estão
se preparando para a segunda fase. Por mais que a FGV tenha inovado em
suas últimas escolhas, a chance de cair novamente um RESE - como
aprendemos a denominá-lo – é altíssima. No entanto, não há razão para
preocupação, pois, como veremos a seguir, a peça não é difícil.
Cabimento
O
RESE só é cabível quando estiver expressamente previsto em lei. A maior
parte das hipóteses está no art. 581 do CPP, mas também há previsão no
art. 294, parágrafo único, do CTB, no art. 6º, parágrafo único, da Lei
1.508/51 e no art. 561 do CPPM. Para a peça prática, todavia, acredito
que o artigo 581 do CPP seja o único relevante. De qualquer forma, caso
caia alguma hipótese da legislação especial, todas as informações vistas
a seguir são aplicáveis, exceto a análise individualizada das situações
previstas no CPP.
Prazo
Em
regra, o prazo é de cinco dias para a interposição, salvo na hipótese
do artigo 581, XIV, em que o prazo é de vinte dias (art. 586, parágrafo
único, do CPP). O prazo para razões é de dois dias, contados da
intimação para a apresentação – e não da interposição. Ainda sobre o
tema, merece menção o enunciado n. 310, da Súmula do STF.
Juízo de retratação
No
RESE, o juiz que proferiu a decisão tem a oportunidade de rever o seu
posicionamento. Para a OAB, não deixe de pedir, na interposição, a
retratação. Em quase todas as oportunidades em que o RESE foi a peça
escolhida, a instituição atribuiu ponto à nota de quem a pediu.
Endereçamento
A
interposição deve ser endereçada ao juiz que proferiu a decisão
recorrida, enquanto as razões devem ter como destinatário o tribunal
(TJ/TRF).
Teses e pedidos
O
pedido é sempre a razão que ensejou o recurso. Se, por exemplo, o RESE
foi interposto contra a decisão que negou a ordem de HC, o pedido é a
sua concessão. As teses, por outro lado, podem ser as mais diversas.
Isso porque, ainda que o pedido seja um só, pode o problema trazer mais
de uma tese de defesa para fundamentá-lo. Exemplo: em um RESE interposto
contra a sentença de pronúncia (art. 581, IV), pode o enunciado trazer
duas teses distintas, uma de inexistência de materialidade e outra de
negativa de autoria, e o pedido, mesmo assim, será um só: a impronúncia.
RESE x Apelação
O
RESE é cabível somente quando houver expressa previsão legal, seja a
decisão interlocutória ou terminativa. A simples menção ao termo
“sentença” não faz com que a peça seja, automaticamente, a apelação, a
exemplo do art. 581, IV, que trata da denominada “sentença de pronúncia”
- que tem natureza interlocutória -, do rito do júri. Na dúvida, avalie
cada uma das hipóteses legais de RESE. Caso o problema não se encaixe
em nenhuma delas, interponha apelação, salvo quando outra peça for
cabível.
RESE x Agravo em Execução
O
agravo em execução está previsto no art. 197 da Lei 7.210/84 (a LEP), e
é cabível contra as decisões do juiz da execução. Em razão disso, uma
porção de hipóteses do art. 581 do CPP não mais comporta RESE - incisos
XI, XII, XVII, XIX, XX, XXI, XXII e XXIII. Entretanto, não é preciso
memorizar todos essas situações. Basta ter em mente que, se a decisão
foi proferida já em fase de execução, a peça será o agravo, e não o
RESE. Não tem erro!
Artigo 585 do CPP
A
exigência de recolhimento à prisão é incompatível com os ditames da
CF/88. Portanto, o art. 585 não pode ser aplicado como condição para
recorrer.
Artigo 581 do CPP
I - que não receber a denúncia ou a queixa;
Trata-se
de decisão terminativa do processo, e não de decisão interlocutória,
provando que a máxima “o RESE é o agravo do processo penal”, dita, com
frequência, em faculdades por aí, não é verdadeira. As hipóteses de
rejeição da renúncia ou da queixa estão previstas no art. 395 do CPP. Da
decisão que recebe a inicial, não há recurso previsto. No entanto, nada
impede que a decisão seja atacada por habeas corpus.
II - que concluir pela incompetência do juízo;
É
hipótese de decisão interlocutória, que não põe fim ao processo, mas
apenas modifica a competência. Quando declarada por exceção, a
fundamentação será a do inciso III. No júri, se, após terminada a
instrução do processo, o juiz desclassificar a conduta para outra que
não seja de competência do Tribunal do Júri (ex.: de homicídio para
lesão corporal), o embasamento legal será o inciso II.
III - que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição;
As
exceções estão previstas no art. 95 do CPP. São elas: a) suspeição; b)
incompetência de juízo; c) litispendência; d) ilegitimidade de parte; e)
coisa julgada. Exceto na primeira hipótese, da decisão que conceder a
exceção cabe RESE. Quanto à incompetência, atenção: se a competência
ocorrer por força de desclassificação, a fundamentação será a do inciso
II.
IV – que pronunciar o réu;
Encerrada
a primeira fase do rito do júri, caso o juiz fique convencido da
materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria
ou de participação, deverá pronunciar, em decisão fundamentada, o réu. A
pronúncia faz com que o julgamento seja submetido ao Tribunal do Júri.
Contra a decisão de pronúncia, cabe RESE. No último Exame de Ordem, a
OAB trouxe uma situação em que o acusado foi absolvido sumariamente.
Neste caso, e na hipótese de impronúncia, a peça cabível é a apelação.
V
- que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança,
indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder
liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante;
VII - que julgar quebrada a fiança ou perdido o seu valor;
Incisos
V e VII: decisões interlocutórias, recorríveis por RESE. Como as
hipóteses estão bem claras, não há motivo para um estudo aprofundado.
VIII - que decretar a prescrição ou julgar, por outro modo, extinta a punibilidade;
IX - que indeferir o pedido de reconhecimento da prescrição ou de outra causa extintiva da punibilidade;
As
hipóteses de extinção da punibilidade estão previstas no art. 107 do
Código Penal. Da decisão que as reconhece ou as indefere, cabe RESE.
X - que conceder ou negar a ordem de habeas corpus;
É
cabível, somente, quando a decisão for proferida por juiz de primeira
instância. Se o HC for impetrado diretamente no tribunal, em caso de
ordem negada, a peça cabível será o recurso ordinário constitucional, e
não o RESE.
XI - que conceder, negar ou revogar a suspensão condicional da pena;
Segundo o art. 157 da LEP, a concessão ou não de sursis
(art. 77 do CP) deve ser apreciada na sentença condenatória, recorrível
por apelação, e não por RESE. Entretanto, caso a decisão a respeito do
assunto seja do juiz da vara de execução, a peça cabível é o agravo em
execução. Portanto, tanto em uma hipótese quanto em outra, a peça não
será o RESE.
XII - que conceder, negar ou revogar livramento condicional;
Trata-se
de matéria pertinente à execução. Como já comentado, qualquer decisão
do juiz da execução é atacável por agravo, e não RESE.
XIII - que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte;
Pode
ocorrer de uma das partes não ter interesse na anulação do processo,
total ou parcial. Sendo o caso, a peça cabível é o RESE. As causas de
nulidade estão previstas no art. 564 do CPP.
XIV - que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir;
Considerada a clareza da redação, não há motivo para análise. A única peculiaridade é o prazo, que é de vinte dias.
XV - que denegar a apelação ou a julgar deserta;
A
denegação da apelação pode ocorrer quando ausente requisito do recurso
(ex.: tempestividade). Já a deserção diz respeito à falta de
recolhimento de preparo.
XVI - que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial;
As
questões prejudiciais devem ser analisadas antes do julgamento do
mérito da ação penal, pois influenciam diretamente na tipicidade (ex.:
não há como julgar um caso de bigamia quando existir dúvida acerca da
existência de casamento anterior). Cabe RESE da decisão que determina a
suspensão do processo criminal em razão de questão prejudicial.
XVII - que decidir sobre a unificação de penas;
Questão referente à execução da pena. Portanto, hipótese de agravo em execução.
XVIII - que decidir o incidente de falsidade;
Trata-se
de decisão interlocutória, pois não põe fim ao processo. Os incidentes
de falsidade estão previstos nos arts. 145/148 do CPP, e, sobrevindo
decisão, o recurso cabível será o RESE.
XIX - que decretar medida de segurança, depois de transitar a sentença em julgado;
XX - que impuser medida de segurança por transgressão de outra;
XXI - que mantiver ou substituir a medida de segurança, nos casos do art. 774;
XXII - que revogar a medida de segurança;
XXIII - que deixar de revogar a medida de segurança, nos casos em que a lei admita a revogação;
Todas as questões são pertinentes à execução penal. Portanto, agravo em execução como recurso, e não RESE.
XXIV - que converter a multa em detenção ou em prisão simples.
Não é mais possível a conversão de multa em detenção ou prisão simples. Por isso, o inciso XXIV não é mais aplicável.
Modelo de recurso em sentido estrito
1ª Peça: interposição.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA … VARA CRIMINAL DA COMARCA …
Observação:
se o processo for de competência da Justiça Federal, “EXCELENTÍSSIMO
SENHOR JUIZ FEDERAL DA … VARA CRIMINAL DA JUSTIÇA FEDERAL DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA ...”.
Nome,
já qualificado nos autos do processo criminal n..., por seu advogado,
que esta subscreve, vem, perante Vossa Excelência, dentro do prazo
legal, com fundamento no artigo 581, IX, do Código de Processo Penal,
interpor RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.
Requer
seja recebido, processado o recurso e, caso Vossa Excelência mantenha a
sua decisão, encaminhado ao Egrégio Tribunal de Justiça.
Observação: imprescindível a menção ao juízo de retratação, pois se trata de uma das principais peculiaridades do RESE.
Pede deferimento.
Comarca, data.
Advogado.
2ª Peça: razões.
Razões de recurso em sentido estrito
Recorrente: Nome.
Recorrida: Justiça Pública.
Processo n.: ….
Egrégio Tribunal de Justiça,
Colenda Câmara,
Douta Procuradoria de Justiça,
A
decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz de Direito da … Vara Criminal
da Comarca … está em total discordância com os ditames legais, sendo
imperiosa a sua reforma, conforme exposição a seguir:
I. DOS FATOS
O
recorrente foi denunciado pela prática do crime previsto no artigo 155,
“caput” do Código Penal, ocorrido no ano de 2001. A denúncia foi
oferecida e recebida no ano de 2002.
Com
base nisso, e levando em consideração o disposto no artigo 109, IV, do
Código Penal, o recorrente requereu o reconhecimento da prescrição, o
que foi negado pelo juiz.
Observação:
não invista muito tempo no tópico “dos fatos”, pois não há atribuição
de nota a ele. Basta resumir o enunciado da questão, com menção aos
pontos de interesse.
II. DO DIREITO
Portanto,
a reforma da decisão é necessária, haja vista que o recebimento da
denúncia ocorreu há 10 (dez) anos, e o prazo prescricional previsto para
o delito é de 08 (oito) anos, segundo previsão do artigo 109, IV, do
Código Penal.
Por
essa razão, com fundamento nos artigos 109, IV, e 107, IV, ambos do
Código Penal, deve ser reconhecida a prescrição e a consequente extinção
da punibilidade.
Observação:
na prova, procure ser conciso em sua manifestação. Para o examinador, o
que importa é a presença da tese e a devida fundamentação. Não basta, é
claro, mencionar o artigo, mas também não é preciso prolongar por
diversos parágrafos o que pode ser dito em poucas linhas. Na segunda
fase, o tempo é o bem mais precioso.
III. DO PEDIDO
Diante
do exposto, requer seja conhecido e provido o recurso, para que se
reconheça a prescrição, nos termos do art. 109, IV, e a consequente
extinção da punibilidade, com fulcro no art. 107, IV, ambos do Código
Penal.
Observação:
como já comentado, ainda que o enunciado traga uma série de teses, o
pedido é sempre um só: a concessão do que foi negado na decisão
recorrida.
Pede deferimento.
Comarca, data.
Advogado.
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